Clareira Central

Pantaneiro ia escutando aquela conversa. Não tinha motivos para sorrir. Simplesmente parava em braços cruzados entre Yara e Victor observando-os enquanto falavam. Por vezes fechada o olho respirando fundo e se segurando para tentar se explicar ou pelo menos se defender.

"Não vou... ela não vai entender e vai complicar ainda mais..."

Era esse o final se tentasse se explicar. A única coisa pela qual poderia contar, era no talento e a lábia de Victor para o livrar daquela. Estava pronto para encarar quaisquer fosse as consequências, seja com a tribo, seja com quer que fosse. Havia usado um vocabulário de baixo calão e por mais baixo que fosse e por mais desonrado que fosse, era a mais pura verdade. O assunto que julgavam ser ultra-sigiloso, quase todos aparentemente já sabiam.

"Estão enganando quem com tudo isso?"

Era a pergunta que se fazia. Queriam manter o protocolo, queriam manter a honra, mas sob qual justificativa? Adiar o inadiável? Ou eles pretendiam guardar aquele segredo, que não era mais segredo, para alguma minoria daquela Seita? Entendia os motivos pelos quais Yara havia ficado nervosa, mas tinha certeza que sua prima se quer fazia questão de entender quais era os seus motivos para ter se alterado daquela forma e ter confiado nela para contar-lhe tudo que sabia foi um erro. Foi um erro ser aberto extrapolando e externando seus sentimentos. Havia pisado um pé fora da linha e a reação de Yara foi lhe dar um tiro de 12 no peito. Bem desproporcional, mas tudo bem. Gaia sabia o que fazia.

"A verdade é que fui um grande idiota mesmo abrindo a boca pra ela..."

Pantaneiro era xucro, bruto, sistemático. Para o caipira não existia meias palavras ou meias verdades. O que era, era, o que não era, era desconsiderado. Era muito mais simples de se viver. Não tinha esses joguetes, não tinham essas malícias. Seu mundo era da selva, onde os humanos eram selvagens e com eles havia aprendido que somente a violência gerava a compreensão.

Já havia sido insultado, ofendido, rebaixado e não havia mais adjetivos para configurar como havia sido qualificado naquela conversa entre Victor e Yara. Havia argumentos que poderia usar? Sim. Adiantaria? Não. Era a mesma situação com Alef. Tudo que dissesse não passaria de promessas.

"Não adianta... vou ter que deixar de ser quem eu sou pra agradar todos aqui..."

Era o seu pensamento até que chega o ponto de escutar a proposta de Victor. Era aprender ou morrer aos olhos do Senhor das Sombras e pelo que parecia ao seu entender, parecia que tinha xingado a própria Gaia. Uma coisa tinha que concordar, Yara havia se aproveitado do seu jeito e da sua estupidez e transformado a situação na pior possível para si mesmo. Se ser uma parente significava aquilo, honestamente, não queria mais conhecer parentes simplesmente pelo fato de achar que ela exagerou e muito em sua reação. Não concordava com aquilo, mas ela tinha lá suas razões e estava errado, bastava concordar e ficar quieto mesmo desaprovando tal atitude.

" Aprender ou morrer... E morrer nunca foi tão tentador quanto antes..."

Talvez abandonar tudo e a todos e deixar que se foderem fosse um bom caminho, mas no final das contas um acordo. Contava com a descrição de Yara e Victor penhorava um favor e a imagem da matilha pela mudança. Agradecia o Senhor das Sombras por aquilo. Poderia dar a voltar por cima. Já nem se lembrava mais aonde tinha se perdido para chegar naquela situação. Se tinha um dia de merda que lembraria pelo resto da sua vida, era aquele, era esse dia.

"Mas se é assim, que seja assim, vou mudar e vou mostrar pra todos que não sou isso que tão pensando... Estão errados e se querem isso, beleza, sei jogar esse jogo, sei ser assim também..."

Era isso ou ser expulso da matilha. A vontade de mudar era maior do que tudo para provar o quanto eles estavam errados e quando conseguisse isso, não seria mérito deles por tentar ajudar a ser um Garou melhor, porque era capaz de fazer isso sozinho, mas sim mérito próprio de abdicar de suas próprias convicções em função Garous egocêntricos.

Ao final de tudo, após Victor e Yara apertarem as mãos, ainda assim não diz nada. Permanecia em silêncio e olhava bem pra cara dos dois observando bem aquela situação. Não se esqueceria daquilo. Tudo que precisava era de uma boa noite de sono e nesse momento só queria ir embora.

Pantaneiro antes de se despedir de Yara, olha bem fundo dentro de seus olhos. Faz um aceno seco para a Philodox e sai acompanhando Victor. Quando afasta o suficiente para que Yara não escutasse, diz para o Senhor das Sombras:

- Obrigado pelo que fez por mim de novo, Victor. Não vou te decepcionar e nem a matilha e nem vai ser necessário me expulsar. Vou mudar esse meu jeito de ser porque não dá pra ser mais assim e quando quiser, eu te explico o que falei pra minha prima pro cê entender o que houve direito e ver o meu lado, se quiser, é claro. Do resto, não tenho mais nada a dizer. Vou provar com atitude e espere de mim um Garou renovado depois que eu dormir.

Dizia isso sério portando-se ao lado do juíz que tinha ajudado-o mais uma vez para não sujar a imagem da matilha.

Pantaneiro responde de pronto:

- Entendi. Obrigado.

Caminha mais um pouco chegando na mesa, também pega um copo de suco e duas coxas de frango. Morde uma e deixa a outra intacta e ao chegar próximo de Skull-Head, estica uma das coxas de frango para o Andarilho pegar.

- Pega aí, xomano. Trouxe pro cê.

Olhava para Skull-Head esperando o Andarilho aceitar e matar sua fome. E depois volta a olhar para Victor mostrando sua atitude companheirística. Já era o primeiro sinal de mudança de comportamento, de se redimir perante um conflito que tinha criado e fazia questão que o Senhor das Sombras notasse aquilo. Já estava progredindo.